Desde 2000, tenho atuado como arte-educadora em instituições culturais de São Paulo. Itaú Cultural, Pinacoteca do Estado, Museu Afro Brasil, são alguns dos vários lugares onde fiz o papel de ser a "ponte" entre as obras expostas e o público.
Quando se é educadora a tarefa parece mais fácil, apesar de algumas péssimas condições de trabalho que se evidenciam na ausência da CLT e, portanto, dos demais direitos trabalhistas. Os educadores ainda não são vistos como profissionais que têm direito a estes benefícios, apesar de ser esta uma profissão visível e necessária nestas instituições desde a Mostra do Redescobrimento que contou com 300 educadores. Necessária porque o que se propõe é uma iniciação de público fruidor-visitante-frequentador destes espaços, ou seja, queremos que as pessoas criem gosto pela coisa.
Porém, o que me pergunto é: para que servem, de fato, os educativos? Alguns educativos efetivam a sua existência com ações que visam trazer o público aos seus espaços e eventos e informá-lo, formá-lo, socializá-lo com as diversas linguagens artísticas e culturais expostas. E conseguem com certa eficácia, muito em parte, pela localização e pela disponibilidade da equipe, incluindo aí não somente os educativos.
Em espaços como Itaú Cultural vemos uma programação gratuita e interessante, porém bastante voltada para o viés da arte e tecnologia. Entretanto, a gama de outros eventos também é ampla, vide uma recente exposição de fotografia contemporânea.
No MAM a preocupação com o atendimento de diversos públicos, com cursos livres (ainda que pagos) e com visitas mediadas é constante e o seu serviço de atendimento e educação inclusiva é um dos mais interessantes que vemos por aí juntamente com o da Pinacoteca do Estado. Fontes ocultas me disseram que há liberdade concedida pelas Diretorias para que a coordenação destas instituições elaborem e coloquem em prática os seus projetos com explícitos resultados positivos.
No caso do Museu Afro Brasil foi desenvolvido, principalmente nos últimos dois anos, um intenso trabalho de equipe. Parcerias com instituições como a APAE, Fundação Casa e Avisa Lá, todas comprometidas com a educação e com a sociedade em vários níveis, as mesmas efetivadas e tiveram grande êxito. Não obtivemos um tostão com as parcerias, somente realização de ambos os lados.
Entretanto, e quando as vaidades interferem em um processo que é voltado e que existe somente devido a existência de um público a ser contemplado e atendido? Bem, após seis anos no Museu Afro Brasil, em acordo com o desejo de parte da Diretoria, fui desligada da instituição porque acredito em um serviço educativo preocupado com o público e não com os "louros" (da vitória). Neste caso em particular, não existem iniciativas de parceria com instituições do extremo da Zona Sul ou da Zona Leste onde estão concentrados os cidadãos que precisam se empoderar e se fortalecer a partir das informações e do conhecimento contido neste espaço. Muitas instituições que desejavam parceria com o Museu Afro Brasil nem tiveram as suas propostas analisadas, afinal, a pergunta que ouvi foi:"o que o museu ganha com isso?". O que um museu público deve ganhar com isso se já recebe verba pública (nossa!) para pagamento de seus funcionários e sua manutenção básica?
Um museu, evidentemente, não deve ser assistencialista, não é o seu papel, porém, um museu que concentra objetos com o tema que aborda o Museu Afro Brasil, deve ter a decência de voltar parte significativa de suas ações à populações marginalizadas, especialmente a negra e mestiça. Quando não realiza este papel educativo inclusivo, o Museu Afro Brasil, veste a personagem que critica: do elitista, opressor (branco), negador de oportunidades.
Não, eu não sou militante ferrenha, todavia, falta esta sensibilidade e generosidade a parte da Direção deste belo e importante Museu. A quem ele quer servir? Que tipo de público se quer ver visitando este espaço e tecendo comentário sobre as obras? Os jovens dos colégios para endinheirados (podem ir também, é claro, mas não somente)? E os jovens que precisam, para reconstruir uma imagem/iconografia negra e mestiça positiva, conhecer Luis Gama, Carolina Maria de Jesus, dentre outros, ou mesmo ver um jovem educador negro detendo um conhecimento que até então só se via nos lábios dos brancos? ou mesmo um educador branco que sabe tanto sobre a população afrodescendente e a trata com respeito?
Eu quero Itaquera, Lajeado, Grajau, São Miguel Paulista, Parelheiros, Campo Limpo, Capão Redondo, São Matheus, dentre outros, neste espaço que explora e reconta a história dos antepassados da maior parte dos habitantes destas regiões!
Esta é uma reflexão ainda rasa que precisa ser reescrita, mas são linhas gerais do meu pensamento. O que aprendi com Miriam Celeste Martins, Denise Emerich, Renata Bittencourt, Anny Lima, Larissa Glebova, Solange Ardila e outras (os) profissionais com os quais trabalhei e estudei.
o artista Rubem Valentim |
o Banco Luba |
a grande pintora Yêdamaria |
Que educação em museus e instituições culturais nós precisamos?
Rê,
ResponderExcluirli, entendi sua mensagem, concordo com tudo, a questão é que a população pobre está tão marginalizada, a falta de acesso à arte talvez faça parte dessa estratégia de manter essa massa alienada, sem o direito de refletir sobre sua própria condição, o Museu Afro seria uma ótima ponte para isso, vc não acha?
bj
até sexta!
Paola,
ResponderExcluirA produção de arte no Brasil tende sempre para abarcar a parcela mais educada via meios formais, empoderada financeiramente e, consequentemente, elitizada. Talvez nem seja uma estratégia, mas quando de exclui a vida da produção artística, ou seja, o humano com suas virtudes e defeitos em prol de um discurso conceitual ou formalista apenas, sem dúvida, que se empobrece e se afstam as possibilidades de se incluir mais pessoas neste diálogo e, mesmo, de fazer com que as pessoas se identifiquem e se reconheçam nesta produção. O Museu Afro Brasil se sua direção deseja realmente interferir de forma enfática no modo como se dão as relações humanas e etnicorraciais, que parecia ser um de seus objetivos, urgentemente deve repensar as táticas de aproximação do público excluído e, ela não se dá somente via observação de exposições que, por vezes, abordam temas que também estão distantes da realidade dos visitantes.